Futuro da política de preços de combustíveis da Petrobras divide pré-candidatos
08 fevereiro 2022
A política da Petrobras para os preços de combustíveis — cujos aumentos sucessivos têm se refletido no bolso dos motoristas e na inflação— divide os pré-candidatos à Presidência e deve estar em debate até o pleito de outubro.
O chamado PPI (Preço de Paridade de Importação) foi implementado em 2016, durante o governo Michel Temer (MDB) e na gestão do ex-presidente da Petrobras Pedro Parente.
A política foi mantida por Jair Bolsonaro (PL), e o atual presidente da empresa, Joaquim Silva e Luna, defendeu recentemente que a petroleira tem de praticar os preços de mercado e não pode fazer política pública.
Líder nas pesquisas, o ex-presidente Lula (PT) tem opinião oposta. Ele vem afirmando que não existe razão para que os preços dos combustíveis sejam internacionalizados.
Na quinta-feira (3), em entrevista a uma rádio do Paraná, o petista reafirmou que pretende acabar com a política que obriga a petroleira a repassar os reajustes de acordo com o mercado internacional.
“Não vamos manter o preço da gasolina dolarizado. É importante que o acionista receba dividendos quando a Petrobras der lucro, mas não posso enriquecer o acionista e empobrecer a dona de casa, que vai comprar feijão e paga mais caro por causa da gasolina.”
O ex-presidente complementou que é preciso governar para todos, mas priorizar os que mais necessitam. Segundo a assessoria de Lula, o político é favorável a uma solução para os preços dos combustíveis que reflita o custo nacional e que seja utilizada a capacidade ociosa de refino.
Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, Bolsonaro tem travado uma disputa com os governadores, ao associar a alta dos preços ao aumento de impostos estaduais, como o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Bolsonaro também tem se eximido de culpa pelos sucessivos aumentos, ao dizer que a política de preços é fruto de erros dos governos passados. “Alguém acha que, se o bandido voltar para cá, vai voltar a gasolina para R$ 3? Ele já fez no passado, o que elevou o endividamento de vocês”, disse o presidente durante um evento com funcionários da Petrobras, em referência a Lula.
Ao mesmo tempo, o Palácio do Planalto elaborou uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que permite a redução de tributos sobre os combustíveis e a entregou a um deputado da base para ser protocolada na Câmara.
Já o ex-ministro Sergio Moro (Podemos) defendeu em evento na semana passada que a privatização da Petrobras e de outras empresas públicas, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, deve ser considerada, sem preconceitos. “Se puder privatizar tudo, ótimo.”
Segundo o ex-juiz, é possível encontrar soluções paliativas para as altas de preços, mas a causa, que é a perda de credibilidade e de confiança no Brasil, precisa ser enfrentada.
“Se a gente não controlar a inflação e não reduzir o dólar, não resolve o problema. E é preciso fomentar a competição de mercado. Outro passo é discutir, de uma maneira permanente e com responsabilidade fiscal, a redução dos tributos.”
Sobre a possível manutenção da atual política de preços, o ex-ministro diz que não pode antecipar o que está sendo discutido com a coordenação econômica de sua pré-campanha.
Em vídeos divulgados em seu canal no YouTube, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) afirmou que mudaria a política de preços no primeiro dia de um eventual governo. “Anunciarei a compra de papéis dos acionistas insatisfeitos, que será feita da forma mais criteriosa possível, preservando os interesses coletivos e o equilíbrio da empresa.”
Ciro diz que será criado um modelo especial de financiamento, usando uma parte das reservas internacionais do país, como uma espécie de empréstimo ao governo.
Ele defende a substituição do PPI por um novo índice chamado PPE (Preço Paritário de Exportação), que seria uma média considerando o custo de exploração, produção e refino mais o preço de exportação de diesel das refinarias brasileiras e o preço do diesel nas refinarias norte-americanas.
“O Brasil paga preços por combustíveis como se nós não tivéssemos uma gota de petróleo no nosso subsolo, nem refinarias. Não serei nem um explorador, como Bolsonaro, e nem um esbanjador, como [o ex-presidente da Venezuela] Hugo Chávez.”
Consultor econômico da campanha de Ciro em 2018, o professor Nelson Marconi, da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que a proposta de privatização da companhia aumentaria o problema.
“A lógica vai ser a mesma de hoje e perderíamos o controle de um insumo estratégico do qual outros países não abrem mão. Se esse modelo for implementado, o que vai prevalecer é a maximização do lucro.”
Na avaliação do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), os preços domésticos devem guardar paridade com preços internacionais e os artificialismos prejudicam a Petrobras e mandam sinais ruins para os investidores.
“É importante destacar que parte das pressões nos preços domésticos dos combustíveis decorre de perda de credibilidade do governo, e a alta desses preços poderia ter sido compensada pelo enfraquecimento do dólar. Do ponto de vista estrutural, é recomendada a venda das refinarias da Petrobras para inserir maior concorrência no setor e incentivar investimentos”, disse por meio de nota.
Ainda segundo o tucano, é necessário incluir formatos que suavizem as variações de preços, especialmente no diesel, na gasolina e no gás de botijão.
Na visão de Maurício Canêdo, professor da FGV Energia e da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), não há uma opção certa ou errada, apenas escolhas que a sociedade está disposta a fazer para arcar com os custos.
“A política atual é basicamente os preços que vigorariam se a Petrobras fosse privada ou se o refino fosse inteiramente privado. A única que mudaria seria não ter mais pressão sobre o governo para modificar os preços.”
Ele lembra que, antes do PPI, não havia uma política de preços objetiva, e a Petrobras decidia por meio de seu acionista principal, a União. Em vários momentos, o preço da gasolina e do gás estavam descolados dos preços internacionais.
“Podemos fazer uma política específica para famílias mais pobres que não conseguem comprar gás de cozinha. Não dá para fazer isso em larga escala, com gasolina e diesel. O ideal é fazer isso pelo Orçamento, do jeito que era feito, era como se o custo não existisse.”
O QUE É A PARIDADE DE PREÇOS?
O PPI (Preço de Paridade de Importação) foi implementado em 2016. Foi uma resposta à política anterior, de controle de preços, praticada com maior destaque durante a presidência de Dilma Rousseff (PT)
COMO ELA FUNCIONA?
O PPI reflete os custos de internalizar o produto —considera o preço de aquisição do combustível (geralmente tendo como referência o que é negociado nos Estados Unidos), mais os custos logísticos e margens de remuneração de riscos da operação
COMO O PREÇO INTERNACIONAL AFETA O CONSUMIDOR?
Quando o barril de petróleo sobe de preço no exterior e o real se desvaloriza ante o dólar, como agora, o combustível fica mais caro para o consumidor brasileiro
O QUE DIZEM OS CRÍTICOS?
Os críticos dizem que a paridade internacional prejudica o consumidor e favorece os acionistas. No ano passado, a empresa pagou R$ 62 bilhões em dividendos, enquanto os combustíveis foram os grandes vilões da inflação em 2021
Autor/Veículo: Folha de S.Paulo